Pedidos de recuperação judicial voltam a cair, mas especialistas esperam piora
Os pedidos de recuperação judicial voltaram a registrar queda em setembro no País, mas especialistas afirmam que essa tendência não é duradoura e que a partir do fim do ano as chances são de uma mudança de rota. Para eles, o rescaldo do desequilíbrio econômico produzido pela pandemia deve puxar o número de pedidos para cima, ainda que a vacinação tenha potencial de produzir uma retomada da atividade. As projeções de expansão bastante baixa do PIB em 2022 já estão dadas, e o crescimento pode ser ainda menor diante da instabilidade política, do desabastecimento das cadeias de suprimentos e do desemprego.
Dados do Serasa Experian obtidos com exclusividade pelo Broadcast mostraram queda de 34,5% nos pedidos de recuperação judicial feitos por empresas em setembro em relação ao mesmo mês de 2020. Em comparação com agosto, também houve recuo, de 48,6%. Os números vêm caindo desde o meio do ano. O economista da Serasa, Luiz Rabi, defende que a facilitação do acesso ao crédito, renovada pelo Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), impactou positivamente os números do indicador.
O programa foi criado no ano passado, em regime de emergência, para apoiar empresas em dificuldades em decorrência da pandemia de covid. Este ano, o governo destinou R$ 5 bilhões ao programa e o tornou permanente. Mas a partir de 2022, os recursos destinados a ele disputarão espaço no orçamento federal, que anda bastante apertado.
Mas há quem acredite que a desaceleração nos pedidos de recuperação judicial está relacionada ao fechamento das portas de muitas empresas.
“Se você analisar os números deste ano em relação a 2020 e em relação a 2019, estão de fato menores, mas nas ruas o número de estabelecimentos fechados é muito grande. O que nos parece é que o pequeno e micro vai continuar encerrando suas operações”, afirma a responsável pela área de recuperação judicial do escritório Souza, Mello e Torres Advogados, Julia Camargo. Para muitos, os custos envolvidos em um processo de recuperação judicial e falência ainda são altos, acrescenta.
Cobertor curto
O fundador da Corporate Consulting, Luis Alberto Paiva, afirma que o Pronampe atende micro e pequenas empresas, mas não resolve o problema de todas e das outras que estão fora do programa. “Ainda que os bancos estejam demonstrando boa vontade, porque entendem que o impacto da pandemia na atividade econômica ainda não passou, outras linhas de crédito emergenciais do ano passado, como o Peac e o FGI, fazem falta”, diz.
Mas a dificuldade no acesso ao capital é apenas uma parte da turbulência a que muitas empresas estão expostas, de acordo com Paiva. Isso porque o desempenho econômico este ano ficou aquém do previsto, há dificuldades para o repasse da inflação e muitas empresas estão deixando dívidas vencerem.
“O PIB precisaria crescer 8% em 2021 para que as companhias se recuperassem dos problemas trazidos pela pandemia”, diz. Ele observa que o desemprego elevado, em meio ao ambiente de inflação alta, já causa problemas para as empresas focadas na baixa renda. Ao mesmo tempo, aquelas voltadas à alta renda estão sendo afetadas pela disparada do custo de importação e pela ausência de mercadorias.
“Não dá para esperar movimentos satisfatórios achando que o Brasil vai crescer. Veremos momentos de muito aperto, teremos um final de 2021 complicado e um 2022 complicadíssimo”, acrescenta Paiva, apontando para os problemas de circulação de mercadorias no mundo.
O sócio-fundador da ARM Gestão, Amin Murad, lembra que as companhias têm tido o desafio de pagar suas dívidas, que deixaram de ser pré-indexadas e estão sendo renegociadas com base na Selic ou na inflação desde o segundo trimestre. “Não conheço ninguém que pagou o Pronampe em sua totalidade”, observa Murad.
Segundo ele, os bancos estão cobrando, mas não executando. Entretanto, acrescenta, a dívida das empresas não caiu, ao contrário, cresce ou se mantém, fazendo com que a recuperação judicial acabe sendo a saída para parte delas.
Murad não acredita que haja um pico de pedidos de recuperação judicial, como aconteceu na crise de 2014/2015. “O ambiente segue de tolerância por parte dos bancos, com um juro um pouco maior, um pouco mais de carência, diminui a prestação, as repactuações continuam em voga”, afirma.